Entre Homero e Dante: Scilla, o mito que repousa sobre as águas da Calábria
- Evelyn Bandeca
- 6 de mai.
- 3 min de leitura
Entre falésias esculpidas pelo tempo e águas que refletem os tons da eternidade, repousa Scilla, um dos vilarejos mais encantadores da Itália meridional. Localizada na região metropolitana de Reggio Calabria, sobre a lendária Costa Viola, essa joia cravada entre mar e montanha não é apenas destino: é narrativa, é mito, é memória viva.
Scilla não apenas evoca o nome de uma ninfa transformada em monstro — figura temida nas epopeias de Homero, temida novamente nas linhas de Dante Alighieri — como encarna um imaginário onde beleza e perigo coexistem poeticamente. Aqui, onde o mar conta histórias e as pedras sustentam séculos, a mitologia se entrelaça com o real em perfeita harmonia.

Um cenário que atravessa séculos
Construída sobre um promontório rochoso que se projeta sobre o mar Jônico, Scilla oferece um espetáculo visual e espiritual. De um lado, o Castelo Ruffo, símbolo do vilarejo, ergue-se como sentinela silenciosa desde tempos bizantinos. De outro, o bairro histórico de Chianalea, com suas casas erguendo-se das rochas e avançando sobre o mar, justifica o apelido de “a pequena Veneza do Sul”.
A cada passo em suas ruelas estreitas, somos convidados a desacelerar. Máscaras penduradas nas portas — antigo costume local para afastar os maus espíritos — parecem hoje sorrir aos visitantes, compondo um quadro de misticismo e acolhimento. Igrejas discretas, palácios históricos como o Scategna e o Zagari, e fontes preservadas oferecem pausas para contemplação e poesia.

O chamado do mar
As praias de Scilla são capítulos à parte. De fácil acesso e banhadas por águas cristalinas, formam um mosaico para os que buscam equilíbrio entre contemplação e aventura. Marina Grande é a mais conhecida — perfeita para famílias e banhos de mar. A Punta Pacì, mais reservada, revela um paraíso para os mergulhadores. Já a Cala delle Rondini seduz pela sua paisagem selvagem e intocada. Para os mais ousados, a Spiaggia delle Sirene oferece águas profundas e um fundo do mar vibrante, digno de lendas.

Tradições que resistem ao tempo - Scilla
Scilla não vive apenas de sua paisagem: pulsa com a força da cultura calabresa. Quem a visita em agosto pode experimentar a Festa de São Roque, padroeiro da cidade, celebrada com devoção, música, fogos e uma comunhão coletiva que transcende gerações. Trata-se de uma oportunidade rara de testemunhar a continuidade viva de um povo com raízes profundas.
A gastronomia local reforça a identidade do lugar. O peixe-espada, símbolo gastronômico da cidade, reina em sanduíches rústicos, grelhados à moda da casa ou servido como a tradicional spatola alla scigghitàna. Massas artesanais — os maccarrùni i casa — recebem ragus robustos de carne de cabra e porco. Doces como mustacciòli, ’nzuddhi, petrali e piparèlle, feitos com mel, figos secos e amêndoas, encerram a experiência com um toque ancestral.

Quando o mito se transforma em horizonte
Talvez o momento mais comovente de qualquer estada em Scilla seja ao entardecer, do alto do Castelo Ruffo, quando o sol se despede lentamente sobre o mar, revelando ao longe a silhueta da Sicília e das Ilhas Eólias. Nesse instante, o visitante compreende que está diante de algo raro: um lugar onde mito e humanidade se entrelaçam, e onde o tempo parece respeitar o sagrado da paisagem.

Informações práticas
Como chegar: O aeroporto mais próximo é o de Reggio Calabria (20 km). Scilla também é atendida por trens regionais e acessível por rodovia (via A24/A1/E45/A2).
Quando visitar: Entre maio e setembro, para desfrutar plenamente do clima e das praias.
O que mais explorar na região:
O centro histórico de Reggio Calabria, com o Museu Nacional da Magna Grécia.
O Parque Nacional do Aspromonte, ideal para ecoturismo e trilhas entre pinheiros, cascatas e aldeias de montanha.
Scilla é um mergulho na mitologia, uma ode ao Mediterrâneo e um convite ao reencontro com o tempo que escorre devagar.A Itália, quando quer, nos oferece não apenas destinos — mas revelações.


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